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A Trajetória de um recordista de Head Down

Fonte: Gustavo Leiros

Eu sou o Bruno Souto Oliveira e comecei no paraquedismo em novembro de 2011 onde fiz um salto duplo em Resende. Assim que pousamos o piloto tandem perguntou se eu havia gostado e disse que eu deveria fazer o curso para saltar sozinho. Perguntei onde fazia e no mês seguinte estava me formando em um final de semana, cheguei a fazer 5 saltos no domingo porque queria me formar rápido. Sempre fui assim, intenso nas coisas que me disponho a fazer. Em maio de 2012 fiz um salto na praia da Barra da Tijuca (RJ) e sofri um acidente no pouso onde fraturei a fíbula e o tornozelo, no momento que meus amigos chegaram para me socorrer a primeira coisa que falei foi: “- Não vou parar de saltar e esse acidente vai ser uma pequena pausa para eu colocar a cabeça no lugar.”

Quando comecei no skydive, quis abraçar o mundo, me senti invencível e estava saltando praticamente todos os finais de semana, tinha encontrado um esporte que me desafiava e ao mesmo tempo me integrava a novas pessoas, me sentia parte de uma comunidade pequena, mas diferenciada pois afinal saltar de um avião com uma “mochila” nas costas que abre um “pano” é para poucos.

Nos 3 anos seguintes dei um tempo saltando muito pouco. Até que em julho de 2015 voltei definitivamente ao esporte. Sempre respeitei a progressão e nessa época me dediquei a voar bem de barriga, participei de alguns camps do Pedro San até que conheci um brother que estava morando no Rio de Janeiro e me apresentou ao freefly. Na época saltava em Resende e poucos atletas praticavam a modalidade, foi então que ele me convidou para ir a Boituva treinar com os melhores do Brasil na modalidade. Nunca me esqueço quando cheguei na antiga sede da Fly Factory e conheci toda a galera almejando um dia voar com eles, mas eu ainda era muito manicaca e mal voava um sit.

Fonte: Rene Simenauer

Em uma dessas idas a Boituva conheci a Domi e a Lu que estavam organizando uma tunnel trip para St Petersburgo na Rússia e decidi fazer parte da trip, pilhei mais dois amigos que toparam e em maio de 2016 fomos para Rússia (até a língua russa estudamos rsrs). Lembro que na ocasião uns amigos me falaram que eu ia voltar ninja voando Head down e eu também achava que sim. Resolvi treinar no wind up que era o único túnel para civil que tinha no Brasil, para chegar na Rússia já voando pelo menos um sit. Foram 5:30 horas voando no Wind Up. Na Rússia os coachs só ensinavam a voar o dinâmico e com vento muito baixo. Gastei umas horas para aprender a voar o back carving e voltei sem voar o head down, longe disso, esse objetivo iria ser adiado por mais uns anos.

No ano seguinte o voo em ângulo estava em moda no Brasil e me dediquei bastante a aprender a modalidade. Boituva e Piracicaba eram a minha segunda casa, praticamente todo final de semana lá estava eu saltando e aprendendo o voo em ângulo. Comecei pelo belly e depois fui para o back, onde senti mais facilidade, acredito que devido ao treino massivo que fiz de back carving na Rússia.

Fonte: Daniel Duarte (Derel)

No meio do ano de 2017 fiz uns treinos one and one de head down mas senti muita dificuldade e achei que ia ser muito mais demorado, cansativo e caro aprender o head down na queda livre, foi então que comecei a treinar no túnel. Nessa época estava liberado treinar no túnel militar em Goiânia. Gastei umas 6 horas, foram três camps, 2 horas em cada e consegui entender a posição. Já transitava do sit para o head down, trocava grips, subia, descia, ia para frente e para trás. Para mim era o suficiente para ir treinar na queda livre. Em dezembro do mesmo ano fiz uns saltos em Resende com um coach e mais um amigo, saíamos na base que explodiu e eu conseguia me aproximar do coach e voar um pouco até que transitávamos para o sit, repetimos o mesmo salto 3 vezes e o tempo fechou, não saltamos mais. Eu sai com a sensação de não ter treinado muito mas que eu havia entendido a posição na queda livre.

Em janeiro de 2018 rolou o primeiro camp de formação de head down do ano, o famoso VT. Eu estava no grupo de iniciantes com o Humberto de Lo. Estava na base que abriu já logo na saída, enxergo o Humberto muito distante e dou um track de back (facilidade pelos voos de angulo) e paro na frente dele, estabilizo e ele faz o grip em mim e assim vamos até finalizar o salto. No debriefing o Humberto conversou com o PP que eu tinha condições de estar em um grupo melhor e assim começa a minha jornada nos treinos de head down. Compareço a todos os treinos, participando de todos os dias e começo a entender o game, as posições, o vocabulário. Camp após camp vou me sentindo mais confortável na saída do avião, aproximação, nos grips e na separação. No mesmo ano estava previsto para acontecer o record sul-americano de head down, participo dos try outs e ganho o meu convite.

Fonte: Paulo Assis

Outubro de 2018 em Boituva foi onde começou a tentativa de quebra do record sul-americano que até então era de 21 paraquedistas. Nosso grupo era composto por mais de 30 paraquedistas distribuídos em 3 aviões saindo a 18.000 pés. Usávamos oxigênio e aquela experiência para mim era surreal. No primeiro salto eu saia do avião antes da base. Nunca mais vou esquecer aquela cena de 3 aviões voando em ala cuspindo paraquedistas que se juntavam em uma formação. Nesse primeiro salto o briefing era para não gripar na base. Eu não tive um bom desempenho nesse record e acabei sendo cortado, justo. Eu estava bastante nervoso e achava que precisava treinar mais, que não estava 100% preparado para um record.  Esse corte foi um combustível que me motivou a treinar mais e me dedicar muito mais aos treinos. O record acabou sendo quebrado com um 28 way e o meu objetivo foi adiado por mais um ano.

Janeiro de 2019 eu retorno aos treinos mensais, nesse ano tem o record brasileiro de head down que iria ocorrer no final de setembro. Meta ajustada e foco nos treinos. Vou aprimorando mais a técnica, treino após treino vou evoluindo e me sinto mais preparado, mais seguro que em 2018. Continuo os treinos, mas aviso que não vou poder participar do record naquele ano. Na ocasião o Humberto e o PP vieram conversar comigo no particular para entender o motivo pois eles falavam que eu tinha chances de estar no record e que eu não desistisse, mas o motivo era que o record ia cair exatamente na data da minha lua de mel na Índia. Na ocasião eu falei para os dois que iria treinar para ser um curinga, que não importaria se eu saísse de diver ou floater, gripasse de direta ou esquerda, base, first, second ou pod closer, eu ia treinar para voar bem em todas essas posições e me sentir muito confortável em cada uma delas. Para que eles pudessem me colocar onde facilitasse o trabalho deles na construção do record. O record brasileiro desse ano foi fechado com 21 paraquedistas e meu objetivo foi adiado por mais um ano.

Em 2020 começa e no calendário sai a data do record sul-americano de head down, no último em 2018 o record foi fechado em um 28 way. Eu começo o ano treinando e focado em ser um curinga, eu busquei me colocar em todas as posições e situações de desconforto, trabalhei o meu lado mais fraco e assim estava aprimorando o meu lado mais forte, mas veio o Covid e o record teve que ser adiado. No mesmo ano no 2° semestre os treinos retornam e seguimos treinando, com foco em ser um curinga treinando todas as posições. Nesse ano não teve record e o objetivo foi adiado por mais um ano.

Fonte: Paulo Pires

Chega 2021 e já tem a data do record sul-americano que a princípio iria ocorrer em abril. Seria um treino somente em janeiro, fevereiro e março já rolariam os try outs onde seriam distribuídos os convites. Por conta do Covid muitos atletas sul-americanos não puderam participar dos treinos e teríamos pouco ou nenhum participante de fora do Brasil no “record sul-americano”. Por esse motivo o record sul-americano foi cancelado e por respeito aos atletas que vinham treinando o record foi alterado para o brasileiro na mesma data. Em virtude do covid o record foi prorrogado para final de Junho e com isso ganhamos mais tempo para treinar. Muito curioso pois nesse tempo que o record foi prorrogado vários nomes surgiram, ganharam o convite e viraram recordistas, coisa que não aconteceria se o record fosse em Abril.

Não lembro onde, mas eu ouvi uma vez que quando um grupo de pessoas praticam um esporte de alto risco em conjunto essas pessoas tendem a ficar mais próximas e se conectam mais, eu acho que isso se aplica a esse record. Foi formado um grupo que se reunia mensalmente para saltar e treinar com um objetivo em comum. Esse grupo foi crescendo e se fortalecendo e criando uma identidade própria. O grupo estava tão focado que decidiu fazer um warm up (aquecimento) no final de semana anterior a semana do record. A minha posição no record até então seria a de second stinger (leia o vocabulário abaixo) e eu gripava em um paraquedista que era o first stinger.

Fomos para o warm up e eu propositalmente me candidatei a saltar em todas as posições para testar se eu estava apto como um curinga. Consegui voar confortável, consciente e seguro em todas as posições. |Duas pessoas não puderam comparecer no record de última hora e os seus slots ficaram disponíveis. Na madrugada de domingo para segunda, o dia que ia começar o record eu estava dividindo o quarto com o Heric e acordamos por acaso quando ele me noticiou que eu ia ocupar o lugar de um dos faltantes que era a posição de first stinger, era 1 da manhã e a partir daí eu não consegui dormir mais. Eu fiquei só imaginando todo o percurso que eu percorri até chegar naquele momento e o trabalho que eu teria que desempenhar nos próximos dias.

Foram 7 saltos até a quebra do record, no primeiro dia fizemos 5 saltos. No primeiro salto do record eu estava muiiito nervoso, e então pratico técnicas de respiração que me ajudaram a relaxar e me concentrar. Eu estava me sentindo muito preparado, foram anos treinando para estar ali. Com o passar dos saltos fui ficando menos nervoso. Na terça-feira o dia amanheceu com o tempo fechado, ficamos a manhã toda no chão aguardando uma janela. Fomos liberados para sair da área e almoçar fora, estávamos almoçando e recebemos uma ligação que o tempo estava abrindo e que deveríamos retornar para área imediatamente, chegamos na área brifamos e fizemos um salto. Segundo salto do dia, 7° do record, umas nuvens se formaram e os pilotos disseram que talvez não conseguiríamos ir a 16.000 pés, ficamos na indecisão se íamos subir ou não, a hora foi ficando mais apertada pois o sol já estava se pondo e recebemos a informação que íamos subir. Foi exatamente nesse salto que fechamos o record, já na separação eu vi umas comemorações e naveguei ainda sem saber se realmente havíamos conseguido, no pouso eu pego a confirmação com o PP e o Roni e ai foi só emoção, gritaria, choro, beijos e abraços.

Fonte: Gustavo Ribeiro (Mandjah)

O record foi muito especial, mas o caminho até ele é que foi muito mais especial, a jornada deve ser sempre maior que o objetivo, são frações de segundos, milésimos que fazem um record mas o que os recordistas mais se orgulham e comentam é sobre a jornada que os levou até ali.

Eu agradeço a todo o grupo de amigos que fizeram parte desse momento muito especial, todos focados e ao mesmo tempo descontraídos fizeram acontecer. Meus parabéns a organização que vem se aprimorando cada vez mais e conduziram com maestria o record. A todo o staff de pilotos, dobradores, manifesto e expectadores/torcedores que nos deram muito suporte.

“A vontade de se preparar deve ser maior que a vontade de vencer.” Bernardinho

Dicas para se tornar um recordista de Head Down:

– Respeite a ordem de progressão, aprenda o voo como um todo. Aprenda a voar belly fly, sit fly, ângulo de barriga e especialmente de costas para então se dedicar ao Head Down.

– Busque treinar no túnel, não é regra, mas vai cortar caminho e é uma excelente ferramenta que não deve ser descartada.

– Dedique-se aos treinos, quanto mais você treinar mais preparado vai estar e isso vai ajudar muito em um momento decisivo.

– Aprenda técnicas de respiração e meditação que lhe trarão mais tranquilidade e reduzem a ansiedade.

– Como tudo na vida leva tempo, é muito pouco provável que você seja um recordista da noite para o dia. Ser recordista exige dedicação, foco, persistência e resiliência. Acredite no seu sonho e vá atrás, never give up.

Fonte: Organização do record brasileiro de head down 2021

Vocabulário:

– Base: é a peça central de uma formação, o núcleo, o alicerce. Sem uma base não tem formação e por consequência não tem record. A partir da base que a formação vai sendo construída. A regra é que os melhores flyers e mais pesados voem na base.

– First stinger: São os primeiros a griparem na base, eles precisam ser rápidos e precisam absorver os impactos da formação sem transferir a energia para base.

– Second stinger: Gripam nos first stingers, precisam ser muito bom flyers.

– Pod closer: Eles são responsáveis por fechar o pod gripando nos second stingers, devem ser excelentes flyers a fim de garantir assimetria no pod.

– Stinger: Gripam no pod depois que ele está formado, precisam ser muito pacientes e rápidos pois devem aguardar primeiro o pod fechar para então fazer o grip.

Pod: é a formação composta de 5 flyers que se forma atrás da base, dependendo do número de participantes no record vão sendo construídos um pod atrás do outro.

Diver: Sai do avião depois da base e precisa dar um mergulho em direção a base.

Floater: Sai do avião antes da base e precisa flutuar, aguardando até que a base chegue neles.

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